Apolo: o anti-cãomunista

Apolo é a prova viva de que o comunismo não é algo natural em nenhuma espécie, nem na caninis humanis. E não adianta me dizer que ele foi influenciado por ser um cão de classe média burguesa! Pelo contrário, tinha tudo para ser comuna.

A começar que foi comprado. Sim, comprado! Paula, minha cunhada, ao pega-lo, não perguntou se ele queria se separar de seus irmãos ou deixar sua mãe sozinha. O animalzinho foi vendido, como simples objeto que sai das entranhas do mundo capitalista alienante machista bolsonárico pablo vittar.

Na infância, sofreu a pior de todas as dores: aquela que surge quando começamos a ter consciência de sermos feios. O cachorrinho era lindo, mas o passar dos meses não lhe foi benéfico. Desconfiamos se realmente era um Lhasa Apso e pensamos que provavelmente seria um Shitsu. Depois, as classificações se aceleraram: talvez fosse um vira-lata, um Mastiff Napolitanoao, um cão que havia sido atropelado e cogitámos que fosse um furão. Por fim, concluímos que era uma mistura entre um cachorro e Satanás.

 Como se não bastasse, sua antiga dona foi viajar e o deixou conosco. E até hoje ela não voltou… Depois disso, falei com a Bárbara que não era para deixar a filha de Paula, a Rafaela, dormir aqui em casa.

Ou seja, meu animal de estimação tinha tudo para ser comunista: foi vendido, foi abandonado e é feio. Mas não! O catioro recuperou, deu a volta dentro da própria sociedade mercantil e mostrou para todos que podia ser um capitalista ostentação!

É verdade que ele não tem muitos bens. Ao todo, são apenas três: uma caminha quadrada, um cobertor que a tia Laura deu e uma bolinha, que ele insiste em deixar cair debaixo do sofá. Contudo, se formos olhar os presentes que já ganhou, mesmo o Lula, notório ganhador de presentes dos amigos, ficaria com inveja. Pelo que eu lembre, já foram 16 ossinhos, 3 caminhas, 4 sapatinhos, 172 gravatinhas, um bichinho de borracha do tio Leo e uma almofada de coração.

E onde estão estes bens? Destruídos! Tudo o que possuía foi devorado, quebrado, rasgado e um deles foi violentado (a almofada de coração). E se você acha que isso é uma forma dele provar que é comunista, por ter devastados os bens produzidos pela máquina de alienação operária, você está errado! Os destruiu sem dividir nada com ninguém.

No Apolo, impera o egoísmo capitalista: eu tenho e faço o que quero. E deixa isso bem claro!

Quando chegou aqui em casa, jogávamos um pão para ele durante quase todas as refeições. Apolo comia o que conseguia. O que sobrava, colocava perto dos nossos pés e começava a rosnar para a gente, para que não pegássemos. Ou seja, simplesmente não queria dividir algo que demos a ele. Até hoje não consigo explicar o motivo disso, mas desconfio que, nos momentos em que a Paula não estava observando, Rafaela comia os pães dele.

Outra vez, eu estava cozinhando batatas. Do nada, enquanto mexia na água, uma delas caiu no chão. Apolo avançou sobre ela, mas, quando a mordeu, queimou a boca, urrando de dor e jogando-a longe. Coloquei o pé, no intuito de protegê-lo, para que não tentasse comê-la novamente. Entretanto, ele mordeu meu dedão… e depois mordeu a batata.    

Ele simplesmente odeia dividir qualquer coisa (um dia eu acho que até rosnou para mim por ter falado com a Bárbara sobre reforma agrária).  Por isso, acredito que meu cachorro seja a segunda maior prova que o comunismo jamais será plenamente implantado.

A primeira são os próprios comunistas.