ERA UMA VEZ EM… CENTRO-OESTE

Eu sei que dividir os companheiros de trabalho como seres humildes ou seres arrogantes é muito simplista. Nem os japoneses, ao classificarem quase 7,7 bilhões de seres humanos em apenas 12 tipos de pessoas, tiveram tanta preguiça assim. O ideal seria realizar uma análise na qual humildade e arrogância fossem combinadas com insistência, competitividade, foco no resultado e competência. Não obstante, eu acabo definindo todo mundo como arrogante ou humilde mesmo, pois tenho descendência japonesa misturada com ribeiro nevense, o que amplifica minha preguiça.

A verdade é que a maioria das pessoas bem sucedidas que conheci na vida são extremamente arrogantes. Aparentemente, eles não conhecem seus limites, não parando de dar cabeçadas até a porta se abrir. E, se ela não se abrir, acham uma janela e pulam fora, para que possam culpar a porta pelos insucessos.

No entanto, o pastor Damares Alves era uma exceção. Ele não era arrogante. Era, simplesmente, bem sucedido. E acho que Deus tinha muito a ver com isso. Acho que está na hora de falar sobre Damares.

Um dia fui a um acampamento gospel-teen, conhecido popularmente como reunião de seres na puberdade que não namoram. Em uma noite, tivemos uma palestra com o pastor Damares Alves, que marcou minha vida (este nome é fictício, já que o a ministra Damares Alves jamais estaria em um acampamento gospel-teen. Talvez ela até vá a um pomar gospel, mas acho que um acampamento não. Só coloquei este nome porque a Damares já falou tanta bobagem que acho que não tem problema colocar mais esta na conta dela).

O pastor foi apresentado como um grande diretor em uma firma famosa, poderosíssima: a Vale (que, na verdade, também não é a Vale, porém imagino que a Vale deve estar cheia de Damares por lá – mas era a Votorantim Cimentos). Naquele dia, ele apresentaria o testemunho de sua ascensão milagrosa e poderosa no mundo empresarial.

No começo da pregação, ele leu uma parte do sermão da montanha, proferido por Jesus, mas podia ter até lido o livro de poemas do Harry Potter que não faria diferença. Ele não fez nenhuma menção a Jesus ou ao sermão. Não o culpo por isso. Ele só seguiu o modelo padrão: a maioria dos cultos de testemunho é um momento para adorarmos o pregador, Jesus não tem muito a ver com isso.

Resumindo sua belíssima história, Damares era um típico cidadão de classe média alta que acreditava ter saído daquele filme de auto-ajuda do Will Smith: “Em Busca da Felicidade” pelo dinheiro. Ele havia se formado em engenharia (não sei onde, ainda assim, seguramente, posso afirmar que o corte de bolsas do CNPQ não teriam o afetado) e começou a enviar currículos. Entretanto, às vezes é meio difícil arrumar emprego se no seu currículo, nas habilidades, você coloca “Elo platina no LOL”, e na parte de experiência, só tem escrito “Herdeiro profissional”.

Por fim, quando já estava desesperado, recebeu o convite para trabalhar como engenheiro júnior com um amigo de infância, um diretor da Vale. O pobre pastor ficou em dúvida se iria, pois o salário era pequeno e deveria se mudar para Goiás. Então, orou para “Deus” que, em sua cabeça, falou que ele poderia ir, pois abrira as portas.

E foi assim que “Deus” começou a agir misteriosamente (como um sniper).

Ele ficou 6 meses em Goiás, comendo o pão que o Diabo amaçou: ganhando como engenheiro em uma cidade na qual, se você juntar dez mil reais, já terá dinheiro suficiente para comprar a prefeitura, o hospital da cidade, a escola municipal e todas as crianças dentro dela, já podendo montar sua própria loja Wish.

Tudo corria mal, até que, ao findar o primeiro semestre, seu amigo começou a ficar estranho. Dores nas costas, dores abdominais, dores no dorso – essas coisas que acontecem quando “Deus” está agindo. Até que um dia ele simplesmente não apareceu no trabalho. Preocupados, foram procura-lo. Chegando lá, encontraram-no trancado no banheiro, gritando alucinado com dor. Damares o levou ao hospital, mas não houve jeito: ele faleceu três dias depois.

Neste ponto do testemunho, o pastor olhou para nós, gritando com os punhos cerrados:

_ Foi assim, meus irmãos, que eu, com apenas seis meses, virei diretor da Vale!

Naquele instante eu percebi que “Deus” realmente abriu as portas para Damares Alves. No caso, as portas do cemitério. Mas parece que ninguém ligou. Todos que estavam ouvindo, em meio a aplausos efusivos, começaram a gritar “aleluia”, “glória Deus” e “queima ele, Jesus”. Aliás, nem todos gritaram. Eu não gritei. Preferi me benzer três vezes e orei a Deus para que nunca me tornasse superior hierárquico de Damares.

Na boa, pessoas arrogantes crescem rápido no trabalho e geralmente são bem sucedidas. Contudo, elas não são nada quando comparadas com as pessoas que possuem “Deuses” homicidas.